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segunda-feira, junho 13, 2005

Manuel Tiago ou...

Álvaro Cunhal, 30 de Abril de 1974

Álvaro Barreirinhas Cunhal, nascido em Coimbra a 10 de Novembro de 1913, faleceu hoje, aos 91 anos. Morreu comunista, como resolveu sê-lo aos 17 anos.
A sua vida confunde-se com a do Partido Comunista Português - PCP - para o qual foi sempre uma referência (foi seu secretário-geral desde 1961), mesmo depois de ter cedido a sua cadeira de secretário-geral para Carlos Carvalhas, em Dezembro de 1992.


Filho de um advogado de província que chegou a governador civil da Guarda, fez a primária em casa, mas aos 11 anos, com a mudança da família para Lisboa, foi estudar para os liceus Pedro Nunes e Camões. Em 1931, com 17 anos, ingressou na Faculdade de Direito de Lisboa e, eleito representante dos estudantes de Lisboa no Senado Universitário, a sua primeira proposta foi acabar com a Mocidade Portuguesa.
No mesmo ano, filiou-se no PCP, entrou para a Liga dos Amigos da URSS e do Socorro Vermelho Internacional e depressa subiu os degraus da organização do partido. Em 1935, já era secretário-geral das Juventudes Comunistas e no ano seguinte entrava para o Comité Central, que o enviou a Espanha, onde viveu os primeiros meses da guerra civil.
Aos 24 anos, em 1937, sofre a primeira prisão, no Aljube e Peniche. Por questões políticas foi obrigado ao serviço militar (início de Dezembro de 1939) na Companhia Disciplinar de Penamacor, mas por motivos de saúde, a junta militar dispensou-o pouco depois. Em Maio de 1940 foi novamente preso.
Estudou na cela e foi à Faculdade, sob escolta policial, defender a sua tese (100 páginas, confiscadas depois pela PIDE) sobre a realidade social do aborto e a sua despenalização. Os examinadores Paulo Pita e Cunha, Cavaleiro Ferreira e Marcelo Caetano (que vieram a integrar o consulado de Salazar) deram-lhe 19 valores.
Até 1947 conseguiu pôr de pé o partido e restabelecer as relações com a Internacional Comunista (interrompidas em 1938). Preso de novo pela PIDE em 1949, é levado no ano seguinte a julgamento e condenado a quatro anos de prisão, seguidos de oito anos de degredo. Enquanto se encontra na prisão, escreve e desenha; esteve mais de oito anos isolado numa cela.
O líder histórico do PCP, como homem inteligente que era e por se tratar de um adversário temível pelo enorme poder de mobilização de massas que lhe era conhecido, foi incluído no primeiro Governo provisório, por decisão de António Spínola, ficando como o "ministro sem pasta".


Nos últimos anos esteve sempre afastado da cena política devido à sua avançada idade e ao seu estado de saúde. Em Novembro último, enviou uma nova mensagem ao XVII Congresso, saudada de pé pelos militantes.


Álvaro Cunhal teve uma filha única, Ana (a mãe foi a sua companheira de exílio Isaura Dias) embora a mulher dos seus últimos anos fosse Fernanda Barroso.


Cunhal foi uma referência para muitos jovens que há 40 anos tinham 18 e 20 anos e ouviam as [suas] histórias e lendas. Dele dirão que permaneceu fiel às suas convicções e ideais, mesmo depois da queda da União Soviética e do Muro de Berlim. Foi sem dúvida alguma uma das maiores figuras do comunismo internacional e um grande português que marcou a história do século XX pela tenacidade e coragem, com que, à sua maneira, defendeu e lutou incansavelmente pelos seus ideais e pelas suas profundas convicções políticas.
Morreu coerentemente, convicto de que esteve sempre certo. Não é verdade que tenha estado sempre certo, mas há uma coisa que ninguém pode negar, é que se bateu sempre pelos direitos dos mais humildes, dos mais pobres e dos trabalhadores.


Não nos esqueceremos jamais do famoso "Olhe que não, olhe que não" com que se atirou a Mário Soares durante um debate televisivo.


Álvaro Cunhal e Mário Soares - 1 de Maio de 1974

A democracia portuguesa ficou mais pobre.


Até amanhã camarada!

3 Comments:

At 14 de junho de 2005 às 10:44, Anonymous Anónimo said...

Em três dias três perdas.
Do Vasco Gonçalves, controverso mas firme nas convicções, a história se encarregará de colocá-lo no seu lugar.
Ontem, uma velhinha - politicamente reacionária - dizia-me já ter rezado por ele; deve a ele a pensão que recebe sem nunca ter descontado.
E esta hein?
De Cunhal só os cegos não enchergam que ele é um dos pilares e alicerces da nossa democracia.
A Democracia como um belo monumento acentam em fundações rudes mas indispensáveis e fundamentais. Sem eles era o caos instalado...
Eugènio de Andrade sublimou nos seus versos a utopia e a elevação do espírito.
Portugal ficou mais pobre

 
At 14 de junho de 2005 às 12:58, Anonymous Anónimo said...

Gostava de ouvir a opinião da ACP (voz não oficial do CC) sobre esta situação, de pessoas que não descontaram receberem pensões de reforma.

 
At 14 de junho de 2005 às 13:08, Blogger ohcaptain said...

É indiscutível a forma como Álvaro Cunhal marcou profundamente a história da política portuguesa do séc.XX (http://2-roads.blogspot.com/2005/06/lvaro-cunhal-1913-2005.html).

No entanto ouvi ontem alguém tecer um comentário pertinente: "E se Álvaro Cunhal tivesse chegado ao poder? Como será que o veríamos hoje?"

 

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